Por Leonardo Gonçalves
Estudiosos dizem existir múltiplas formas de governo. No entanto, para fins práticos, eles acabam por desembocar em uma destas duas tendências: a democracia e a ditadura. O primeiro (em teoria) se dá com a participação do povo; o segundo, muitas vezes, sem ela. Na democracia, existe um incentivo ao pensamento gratuito e uma preocupação com a liberdade de exprimir estes pensamentos. Nos governos ditatoriais, existe a coibição das idéias opostas, e em nome dos “ideais” se assassina todos aqueles que possuem uma visão distinta.
Cuba se encaixa neste último perfil. Lá, idéias divergentes não são bem vindas. Somente crentes burgueses de classe média ou analfabetos sociais usam uma camisa vermelha do Che Guevara e acham que são evangélicos revolucionários. Nenhuma revolução que se dê por eliminação dos opostos e supressão da liberdade serve aos interesses do reino. Neste ponto, alguém certamente dirá: “Mas o que dizer das campanhas militares de Israel no AT, que ceifavam milhares de vidas?”. Da minha parte, nada respondo. Somente me assombro com o fato da igreja de Cristo, passados dois mil anos, não conseguir se desvencilhar destes rudimentos, insistindo em viver com um pé no monte Sinai!
Reconheço que governar não é uma tarefa fácil. Falar de democracia e aplicar esta filosofia de ministério às igrejas evangélicas pode parecer um surto neoliberal. Não obstante, as razoes pelas quais proponho esta analogia não são revolucionárias. São apenas sensatas.
Historicamente, há “razoes” (supostas, claro!) que justificam a forma autoritária com que muitos líderes regem suas denominações. A teocracia do Éden e a monarquia de Israel oferecem exemplos de governos centralizados e centralizadores. Em toda a história, Deus sempre levantou líderes e os investiu de poder, de modo que fossem representantes dele. Seus “ungidos”. Outro fator a considerar é que nem sempre o povo tem razão, e ceder aos seus caprichos às vezes equivale a se opor a Deus. Veja o que aconteceu com Israel no deserto: Moisés demorava lá no Sinai, e o povo teve uma “grande idéia”. Despojaram-se dos objetos de ouro e pediram a Arão que lhes fizesse um ídolo para adorar. Arão era o sacerdote, e como tal devia ter se oposto à maioria, mas acabou cedendo à pressão e confeccionando um ídolo, tal como acontece hoje na dita igreja evangélica que se adapta às demandas mercadológicas, ignorando as ordenes de Deus.
Se por um lado, nem sempre é útil dar voz ao povo, também devemos reconhecer que governos centralizados não são o único exemplo de liderança encontrados na bíblia. Veja o caso de Moisés, durante o êxodo. Liderar uma multidão de milhares não era uma tarefa fácil, e muitas pessoas não recebiam a atenção que necessitavam. O povo estava descontente, e Moisés se desgastava. Seu sogro veio visitá-lo e o aconselhou a delegar autoridade constituindo juízes que pudessem se ocupar das causas menores. O mesmo principio aparece no Novo Testamento. Nele, vemos uma igreja composta por múltiples ministérios, muitos presbíteros, diáconos que pudessem cuidar das questões materiais, mestres que zelassem pela doutrina da igreja, enfim, um sistema de governo compartilhado a fim de envolver o maior numera de pessoas no serviço cristão, edificando assim o corpo de Cristo.
Como evangélico, brasileiro e membro de uma igreja pentecostal, escutei inúmeras vezes que a Democracia não servia aos interesses de Deus. “Demo-cracia é o governo do demo!”, repetia um dos pastores que tive, aludindo a um governo que, segundo ele, velava pelos interesses do demônio. Na verdade aquele pastor, assim como muitos líderes de hoje, confundia democracia com anarquia. Era como se o governo democrático excluísse totalmente o papel do pastor e a sua influencia, quando na verdade ela apenas confirma a legitimidade do mesmo.
Insisto que não estou criando nenhuma novidade, e nem quero. Se uso palavras como “democracia” e “ditadura” é apenas para que este texto alcance o maior numero de pessoas (por isso, caro irmão “teólogo”, não se sinta ofendido e nem me chame de herege pelo fato de não utilizar seus jargões esquisitos como teonomia, teocracia, governo presbiteriano, congregacional ou ainda as formulações recentes e pós-modernas “eclesiologia líquida” e “igreja orgânica”. Poupe-me deste enfado!).
Continuando esta comparação, notamos que a democracia não é anarquia, mas seu oposto. Ela não exclui a liderança, mas a reconhece. Brasil e Estados Unidos são sistemas democráticos, e ambos possuem presidentes. Democracia não é um autogoverno. Sou radicalmente contra o “autogoverno” dos crentes, a filosofia de ministério que afirma que não precisamos de pastores e outros ministros e que cada crente é pastor de si. A experiência comprova que este autogoverno nada mais é do que um autoflagelo, pois deixa de reconhecer que nem todos os membros do corpo possuem a mesma função (1Co 12.29, Ef 4.11). No entanto, o despotismo presente nas igrejas pentecostais e neopentecostais, onde os pastores fazem o que desejam sem nunca ser contrariados é uma barreira para o desenvolvimento de um ministério saudável.
Governos democráticos não regem a si mesmos. Eles são regidos por uma constituição. O presidente, ao menos em tese, é aquele que deve cumprir e fazer cumprir os princípios da Carta Magna da sua nação. Os ministérios (defesa, economia, agricultura), desempenham seus múltiplos papéis, mas também são regidos e limitados pela Constituição. Por tanto, se existe uma força soberana em uma nação democraticamente governada, não é o povo, mas a Constituição Federal.
Do mesmo modo, entendo que é possível ter autoridade eclesiástica sem ser autoritário ou complacente. Isso acontece porque, embora amplamente abertos ao debate e contestação, nós também possuímos uma Carta Magna, uma “Constituição do Reino”, que deve reger a conduta e crença dos pastores, ministros e leigos, e que possui testemunho interno e externo de sua confiabilidade, sendo atestada e reconhecida como Palavra de Deus. Esta constituição não está sujeita a emendas, de modo que os ministros que desejam viver sob a égide do evangelho e apascentar o rebanho de Cristo devem cumprir e fazer cumprir esta Palavra, sob pena de anátema naquele dia em que os segredos do coração humano serão revelados.
Por isso, afirmo que a democracia não é inimiga da igreja e nem dos pastores. Ela não é um governo do “demo” como alguns querem sugerir, mas aquele que melhor rege o interesse da nação e dos que estão sobre o seu solo. Nela, o líder é supervisionado por toda nação e auxiliado por todos. No entanto, pesa sobre ele a autoridade de governante, não podendo ceder aos caprichos aqueles que não se submetem ao prelado da Constituição, do mesmo modo que o pastor não deve, à semelhança de Arão, ceder às vontades do grupo dissidente quando este se opõe à vontade de Deus revelada, com ingratidão, defraudando a Deus que os resgatou. Em casos assim, espera-se do líder que seja viril ao ponto de cumprir seu chamado e, se necessário for, se opor a tudo e a todos para fazer valer a vontade de Deus.
Quando o oposto acontece, isto é, quando é o líder quem se opõe claramente às verdades expressas nas Escrituras, convém que os ministérios tomem o “poder”, despojando o governante até que se levante outro que, com ética, respeito por Deus e sua Palavra, prometa conduzir o povo de modo fiel, honrando ao Sumo Legislador deste Reino, o nosso Soberano Senhor.
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Leonardo Gonçalves é missionário, professor de teologia sistemática e blogueiro
Nota:
Embora este ensaio utilize uma analogia de governos seculares, as filosofias de ministério aqui defendidas são o Presbiteriano e Congregacional, ao mesmo tempo que rejeitamos à ideologia neopentecostal (centralizada, e “de cima para baixo”) e as cosmovisoes pós-modernas e/ou emergentes. As igrejas pentecostais em geral possuem, em teoria, um regime Congregacional, embora na prática o que se impõe como lei é a vontade do pastor presidente por cima da assembléia e dos ministros.
1 comentários:
Um pouco sobre Política
Estava a ver emails e me deparei um uma chuva de emails a respeito das Eleições 2010. Nada de anormal, ano eleitoral e sempre assim, candidatos e mais candidatos em guerra com a mídia e com outros partidos, contudo o que me chamou a atenção foi um email contendo os vídeos dos debates dos candidatos ao maior cargo público do Brasil, não havia visto nenhum debate e graças a esse generoso cidadão que nem conheço, tive a enorme tristeza de ver os debates, então ai vai meu parecer a respeito dessas eleições que me fizeram ficar esse final de semana todo a pensar e em pleno domingão de madruga cheguei a conclusão que ai vai:
Infelizmente nosso pais é obscuro, obscuro porque nunca sabemos quem é confiável, ainda mais se tratando
de políticos que deveria ser algo visto como honradez e dignidade, que nesse misero país e sinônimo de pilantragem, falcatrua e desonestidade além de outras coisas que vos deixo a critério, no entanto, disse obscuro pois nesse debate, percebi o quanto fica difícil escolher um candidato ao cargo Supremo. Os debates quando começaram nas Ágoras gregas, tinha o objetivo de mostrar ao povo, o que poderia ser feito na cidade e como seriam feito, os benefícios e claro, coisas que deveriam mudar, porém hoje, ao ver os debates do século 21 não consigo assimilá-los, não se mostra nada de interessante a não ser acusações, ninguém mostra o que pode fazer, mais o que o outro não fez, ninguém consegue falar nada sem antes acusar o outro de alguma coisa, o que deveria ser debate virou júri popular, onde os acusados são promotores e advogados e o povo todo assiste, no final das contas quem for presidente é quem foi considerado inocente ou pelo menos foi o menos culpado, sou jovem e vi pouquíssimas eleições, porém tenho convicção que o destino de uma nação não pode ser decidida assim, além do mais democracia não tem nada ver com isso, acredito que os Gregos teriam vergonha de um política assim, ser gerada a partir do Ideal Grego de civilização.
Caros irmãos sei que votar em branco ou nulo e visto com maus olhos em vosso meio porém as opções são muito poucas, contudo vejo em Marina um leve esperança (bem leve mesmo).
Paz de cristo a todos.
Por Felipe Braga, um cara que as vezes resolve se meter em política só porque ficou triste com alguma coisa.
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